COMUNICAÇÃO NAS REDES

Toc, toc, toc: Secom do governo Lula agiu de forma estrategicamente perfeita e precisa avançar, diz especialista

Felipe Pena, pesquisador e professor de Comunicação da UFF, crava: "A extrema direita começou a entender que a esquerda está, aos poucos, tomando os memes de produção"

O presidente Lula e o ministro-chefe da Secom Paulo Pimenta.Créditos: Ricardo Stuckert
Escrito en POLÍTICA el

"Toc, toc, toc". Uma simples onomatopeia, que reproduz o som característico de batidas em uma porta, pode representar um ponto de inflexão na estratégia de comunicação do governo Lula. Até então criticada por sua abordagem considerada "analógica" nas redes sociais, a atual administração federal decidiu ousar, recebendo elogios de apoiadores e críticas da oposição.

Na segunda-feira (29), a página oficial do governo brasileiro no Instagram incorporou um meme em voga, o "toc, toc, toc", para divulgar uma campanha de prevenção à dengue.

A publicação foi interpretada por muitos como uma forma de ironizar ou debochar do clã Bolsonaro, especialmente após a operação da Polícia Federal (PF) contra o vereador Carlos Bolsonaro (PL-RJ). O "toc, toc, toc" tornou-se um meme associado ao barulho das batidas na porta realizadas pelos agentes da PF.

"Quando os agentes comunitários de saúde baterem à sua porta, não tenha receio, apenas os receba", destaca parte do texto compartilhado no perfil oficial do governo federal nas redes sociais, acompanhado de uma imagem que ilustra uma mão batendo à porta, com a inscrição "toc, toc, toc".

Reprodução

A publicação viralizou rapidamente. No entanto, parlamentares bolsonaristas argumentam que a administração federal violou o princípio de impessoalidade, anunciando medidas judiciais contra a Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República (Secom), liderada por Paulo Pimenta.

Tomando os memes de produção 

Para Felipe Pena, professor e pesquisador da Universidade Federal Fluminense (UFF) e especialista em Comunicação, a Secom do governo Lula acertou ao fazer a publicação se aproveitando de um meme utilizado para ironizar a extrema direita e, mais especificamente, o campo bolsonarista. 

"Eu acho que a Secom agiu de forma muito assertiva, correta e estrategicamente perfeita. Tem que continuar agindo dessa forma porque o mundo da comunicação mudou. Não dá mais para ter a mesma comunicação quadrada de 20 anos atrás. E a Secom entendeu isso e fez muito bem. Essa comunicação é específica para as redes. A Secom conseguiu, inclusive, passar a sua mensagem, no caso dessa peça sobre a prevenção à dengue", analisa Pena. 

Segundo o professor, a reação virulenta da extrema direita à publicação irônica no perfil oficial do governo, alegando que, supostamente, o princípio da impessoalidade na administração pública teria sido ferido, se deu pelo fato de que tal campo político começou a perceber que a esquerda está "tomando os memes de produção" —  aqui o pesquisador faz referência ao nome do quadro que apresenta na TV Fórum

"A extrema direita começou a entender que a esquerda está, aos poucos, tomando os memes de produção. E é por isso que a oposição chiou e falou sobre o princípio da impessoalidade. Não feriu o princípio da impessoalidade. Não tem essa interpretação. Não vai ter consequência legal. Não pode haver consequência legal se a sua mensagem se dirige a um público amplo para um determinado assunto. A peça é tão inteligente que não cabe nem essa interpretação jurídica, nem que você faça um malabarismo jurídico para isso". 

Felipe Pena ainda elogia a explicação de Paulo Pimenta em resposta aos críticos da publicação em questão. Segundo o ministro-chefe da Secom, se tratou de uma estratégia que aproveita as "janelas de oportunidades e fluxos" nas redes sociais.

O pesquisador defende, contudo, que o governo não recue na estratégia diante das críticas e, mais do que isso, avance em novas táticas de comunicação digital. 

"O ministro Paulo Pimenta entendeu, finalmente, os conceitos aplicados à comunicação nas redes sociais. Pelo menos alguns deles, não todos ainda, mas ele entendeu e fez uma ótima defesa da peça. Ele está correto, se saiu muito bem, só precisa agora não recuar. Aliás, além de não recuar, ele precisa avançar. O que falta ainda é mapear com mais intensidade os grupos de WhatsApp, de Telegram da extrema-direita e reagir com mais velocidade às fake news". 

"A minha sugestão sempre foi que o governo fizesse oficialmente um 'gabinete do amor', e obviamente isso é um nome metafórico, para se contrapor a esse gabinete do ódio que a gente está vendo ser desmembrado pela Polícia Federal. É fazer a mesma coisa, só que de forma oficial. Surgiu uma fake news? Desmente essa fake news com meme, com peças como essa da dengue. Tem que fazer isso. E para fazer isso tem que montar uma equipe oficialmente dentro da Secom. Esse é o meu conselho ao Paulo Pimenta", conclui Felipe Pena.