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Lula, Raoni, Macron: os bastidores de um encontro na Amazônia

Emmanuel Macron, ao lado de Lula, condecorou o cacique Raoni com a mais alta honraria francesa em evento na Ilha do Combu; saiba detalhes

Lula, Cacique Raoni e Emmanuel Macron na Ilha Combu, em Belém (PA).Créditos: Ricardo Stuckert
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Em visita a Belém nesta terça-feira (26), o presidente francês, Emmanuel Macron, acompanhado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na presença de lideranças indígenas, condecorou o cacique Raoni Metuktire com a Ordem Nacional da Legião de Honra, a maior honraria concedida pela França. A cerimônia ocorreu em uma tenda montada na Ilha do Combu, uma das 42 ilhas que fazem parte da capital paraense, que sediará a COP 30 em 2025. A reportagem da Fórum acompanhou o evento. 

Em seu discurso antes da entrega da medalha, Macron destacou a luta global de Raoni pela preservação da Amazônia e pelos povos indígenas.

“Você se tornou embaixador do seu povo e interlocutor dos poderes públicos brasileiros e sempre sentinela do seu território”, afirmou.

Macron condecora Raoni com a Ordem Nacional da Legião de Honra (Foto: Ricardo Stuckert)

Em determinado momento, Macron interrompeu sua fala, sorridente, ao ver Lula tirando uma foto sua. Então apontou para o cacique Raoni, pedindo para que o presidente brasileiro tirasse uma foto do líder indígena.

E continuou, em referência a Raoni: “Você nunca parou de lutar e nunca irá parar. Eu sei do orgulho do presidente Lula de estar ao seu lado e de estar ao lado de todos os povos indígenas e, que pela primeira vez, nomeou uma ministra indígena encarregada dessas questões [Sônia Guajajara]”.

Raoni agradeceu o presidente francês e aproveitou para pedir que Macron o apoie para receber o Prêmio Nobel da Paz. 

Veja vídeo: 

O cacique também pediu ao presidente Lula que não aprove a construção da chamada Ferrogrão, que ligaria Sinop, no Mato Grosso, ao Porto de Mirituba, no Pará.

“Eu sempre defendi que não pode haver desmatamento, não consigo aceitar garimpo, então, presidente, eu quero pedir novamente para que você trabalhe para que não haja mais desmatamento e gostaria de dizer que é necessário demarcar terras indígenas para as comunidades que ainda não têm terra”, afirmou em língua caiapó, traduzida ao português por um intérprete.

No geral, o encontro ocorreu em tom descontraído, com ambos os presidentes enxugando o suor do rosto, em um calor de 29ºC, mas com sensação térmica de 35ºC, devido à alta umidade da região.

Vendo Macron passar o lenço no rosto, a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, aproveitou para dizer: “Por isso que é bom fazer a COP aqui [em Belém], para sentir o calor da Amazônia. E para sentir que o mundo está esquentando e que a gente precisa de medidas urgentes, que a gente precisa implementar os acordos, que os países que tenham mais condições possam ajudar o Brasil”.

Ao falar que a imprensa precisava deixar o evento, por questão de logística, Lula cometeu uma pequena gafe, imediatamente corrigida, chamado Macron de Sarkozy (ex-presidente francês): “Eu e o Sarkozy ainda vamos viajar para o Rio de Janeiro hoje à noite... Eu e o Macron.”

Samaúma de 250 anos

Macron chegou de barco à Ilha do Combu, acompanhado de Lula, do governador do Pará, Helder Barbalho, e das ministras Marina Silva (Meio Ambiente) e Sonia Guajajara (Povos Indígenas), por volta das 18h.

Veja vídeo da chegada à ilha: 

A primeira parada foi em frente a uma samaúma de 250 anos, árvore que chama a atenção pela largura do seu tronco, com raízes tabulares, e pela altura. A ministra Marina Silva falou sobre a samaúma para um Macron sempre atento e sorridente.

Lula e Macron admiram a Samaúma de 250 anos (Foto: Ricardo Stuckert)

Depois, o presidente francês visitou a fábrica de chocolate Filha do Combu, de propriedade de Izete dos Santos Costa, a Dona Nena, antes da cerimônia de entrega da Legião de Honra. O estabelecimento é considerado um exemplo de economia sustentável, preservando seu entorno.

“Receber dois presidentes na minha fábrica é maravilhoso. Tenho muita gratidão por esse momento especial", disse Dona Nena. 

Caminhando pela ilha, as ministras Sonia Guajajara e Marina Silva falaram com exclusividade à Fórum. “É muito bom o Macron vir ao Brasil, conhecer uma parte da Amazônia, falar com as lideranças indígenas, é um diálogo necessário”, disse Sônia.

Já Marina destacou a relação bilateral histórica com a França.

“Queremos aprofundar essa relação em várias parcerias. Uma delas são acordos de cooperação técnico-científica, porque compartilhamos, inclusive, o Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque [na fronteira com a Guiana Francesa]. E, nesse espaço, é possível estabelecer uma parceria em relação à preservação e ao uso sustentável da biodiversidade.”

Marina Silva, Helder Barbalho, Lula, Emmanuel Macron e Sonia Guajajara (Foto: Ricardo Stuckert)

E continuou: “Um outro aspecto é essa parceria com os povos indígenas, como já disse a ministra Sônia. E, para nós, é muito importante o debate sobre bioeconomia para que possa abrir os mercados para esses produtos”.

Marina disse que, com a realização da COP 30 em 2025, Belém passa a ser um espaço simbólico, “onde todos aqueles que vão participar da conferência têm a responsabilidade de alinhar as metas de redução de CO2”. “Não é por acaso que o Brasil dá uma contribuição histórica. Nesse primeiro ano do governo do presidente Lula reduzimos o desmatamento em 50%.”

Macron segue ainda hoje, com Lula, para Itaguaí (RJ). Depois ainda visitará São Paulo e Brasília. Esta é a primeira vez que Macron visita a América Latina. O último presidente francês que esteve no Brasil foi o socialista François Hollande, em 2013.